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segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Não Desobedeça


Quando acordei, me vi sentado no assento dianteiro de um ônibus. Olhei para a janela ao meu lado, mas conseguia ver apenas escuridão. O motor do ônibus ressoava, embora eu não soubesse dizer se estávamos em movimento. Não havia motorista, como eu percebi quando olhei para frente, e tinha uma parede de metal no lugar onde o pára-brisa deveria estar. Nela, escritas em uma substância marrom-avermelhada, havia três frases:

  Não se vire

  Não fale

  Não minta

Eu sabia que não estava sonhando. Olhei para trás, sem ter certeza se estaria aliviado se alguém estivesse no ônibus junto comigo. Não vi ninguém. Todos os assentos estavam vazios. Quando me virei novamente na direção da frente do ônibus, ouvi um estrondo contra a parede, como se tivéssemos batido em algo. Na superfície metálica, onde costumavam estar três linhas de texto, havia agora apenas duas:

Não fale

Não minta

Prendi o fôlego, lembrando imediatamente que a primeira linha dizia para não me virar. Meu estômago embrulhou e comecei a me sentir nauseado enquanto olhava para a parede. Perguntando-me se havia apenas imaginado aquela primeira frase, me virei novamente para me certificar de que não havia ninguém se escondendo embaixo de um dos assentos, mas antes que eu pudesse me levantar para conferir, vi uma figura corpulenta sentada no fundo do ônibus.

Me abaixei atrás do fundo do assento, com o coração martelando. Eu tinha olhado por apenas um segundo, mas aos poucos a imagem da figura que eu havia visto tomou forma na minha mente. Era um grilo gigante, sentado sob seu abdômen com as pernas cruzadas. Eu vomitei no chão, ainda abaixado. Estava aterrorizado. Tentei abrir a janela, mas ela não se movia, embora não houvesse nenhuma tranca visível. Então eu bati no vidro e gritei por socorro. De repente, o motor desligou. Eu não conseguia ouvir nada além de minha própria respiração e batimentos cardíacos. Eu esperei, prendendo o fôlego e aguçando os ouvidos para ver se conseguia ouvir algum ruído vindo do lado oposto do ônibus. Não ouvi nada.

Estava pronto para correr até as portas e tentar empurrá-las para sair, mas então olhei para a parte dianteira do ônibus, e fui novamente saudado por palavras faltando. Não fale já não estava mais escrito na parede, e apenas Não minta permanecia. Eu estava em uma zona crepuscular? Será que eu estava simplesmente sonhando e vivendo o pesadelo mais realista que já experienciara? Eu me fiz essas perguntas, tentando me acalmar, mas então lembrei do grilo que estava sentado atrás de mim.

Na primeira vez em que me virei, não havia nada lá, mas quando dei uma segunda olhada, vi o grilo. É claro que eu estava apenas vendo pelo canto do olho, então talvez eu estivesse simplesmente imaginando aquilo, assim como os escritos na parede. Eu não queria me virar, mas enquanto continuava sentado ali, temia que houvesse uma criatura atrás de mim e que ela pudesse se aproximar por trás e me atacar a qualquer momento. Eu espiei lentamente pela lateral do meu assento e imediatamente me arrependi. Podia ver claramente que o grilo estava agora erguido sob suas patas traseiras. Tinha cerca de 1 metro e 50 de altura e seus olhos eram do tamanho de bolas de baseball. Eu xinguei baixinho e passei a ouvir o cricrilar de muitos grilos. Era baixo, mas definitivamente vinha de dentro do ônibus.

- Quem é você?! - perguntei.

  Em vez de parar quando ao som do meu grito, o cricrilar aumentou. Eu suava profusamente, ainda colado ao meu assento.

- Por favor, me deixe em paz!

O ruído ficou mais alto. Eu comecei a chorar, mas rapidamente meus soluços foram abafados pelo coro de mil grilos. Meu coração palpitava, e eu não aguentava mais. Eu me levantei e olhei para o grilo. Ele estava sentado um pouco mais perto agora, me encarando. Sentadas atrás do grilo havia o que pareciam ser pessoas com seus rostos roídos. Eu andei lentamente para trás, na direção das portas traseiras do ônibus, mantendo contato ocular com o inseto gigante. Assim que me encontrava ao lado das portas, me virei para tentar abri-las na base do chute. Elas não cederam. Quando voltei a olhar, percebi que o grilo estava ainda mais próximo. E todos os assentos atrás dele estavam ocupados por pessoas com rostos mastigados.

Eu rapidamente pulei de volta para o meu assento. Ergui a cabeça e gritei quando vi que o grilo estava agora a apenas alguns assentos de distância. Rastejei até o chão e sentei no meu vômito. Quando olhei para cima, o inseto gigante estava bem atrás do meu assento, me encarando. Meus gemidos eram inaudíveis. Meus ouvidos latejavam enquanto o grilo se inclinava sobre mim e o cricrilar ficava mais alto e furioso. Eu tinha medo de desviar o olhar ou me esconder embaixo do assento, porque a criatura poderia tranquilamente aparecer em cima de mim se eu me distraísse por um segundo. Eu queria cerrar as pálpebras, mas o medo de ser atacado manteve meus olhos fixos no grilo.

Me cobri com meus braços em um gesto protetor, esperando para ser devorado. O grilo lentamente moveu uma das patas e a estendeu em minha direção. Presa a ela havia uma folha de papel. Eu a balancei, e ela caiu no meu colo. Eu a olhei e li a pergunta que estava escrita:

"Você vai morrer agora?"

Fechei os olhos e cobri as orelhas. Soluçando intensamente, fiz que sim.

3 comentários:

  1. Provavelmente ele pode não ter morrido já que na eminência da morte ele não descumpriu a ultima regra de não mentir!

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    1. Ai fica um paradoxo, se ele disse q sim e n morreu, ele mentiu e logo vai morrer

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